Ancestralidade num dia normal
Chego agora de lá de fora, quase ensopada, mas não! Chove a chuva molha tolos e descanso agora de umas boas horas de trabalho na terra.
Mãos deliciosamente sujas de lama, óculos tão molhados que mal posso ver o que faço – sigo intuitivamente e derreto-me na limpeza do terreno e na melhor definição dos caminhos, cheios de ervas agora, e arranco a erva dos novos canteiros.
Depois de os encher de composto, a chuva incentivou as plantas. Tenho surpresas constantes, ora nas batatas doces que agora estão enormes (pelo menos a rama), ora nas couves que rebentam agora, mas que são uma atracção enorme para as lesmas, ora nos cogumelos silvestres.
Consegui colher um para sol e o David delicia-se agora ao jantar com ele bem cozinhado em ghee ao lume, aqui na cozinha.
Lembra-me que sinto falta de cozinhar ao fogo. Fogo mesmo, lá fora, no pote.
E lembra-me dos meus queridos avós, de todos e dos meus pais.
E de parar. De desacelarar.
É uma ligação grande às raízes.
E mais do que ligação, perceber, que eu sou essas raízes também.
Saudades.
Tenho saudades dos meus ancestrais.
Mas se eu sou ancestralidade também, as saudades são ilusórias de alguma forma.
Olho a avó Ilda e o avô Ramiro.
E abraço-os. Num abraço forte e grande.
E ouço-os.
Toda a terra é ancestralidade, e os cogumelos que viste e as mãos no solo.
O trabalho na terra é ancestralidade.
Nada tem de vir de esforço.
Pode ser chamado de esforço de amor.
Colocar o coração em tudo.
Em tudo.
No campo ou na cidade.
Na terra ou na cozinha.
No trabalho e no lazer.
Em tudo.
E surgiu um Avé Maria.
Oração divina.
Do Sagrado Coração de Maria.
Da mulher, do feminino em todos, não só em mulher.
Comments
Post a Comment